13 de novembro de 2009

Lema de vida

Lemas de vida, máximas e conselhos só servem para quem os tem ou dá.
Passei algumas vezes por momentos de inigualável tristeza. A minha vida ainda não foi longa, espero estar ainda no primeiro terço. A minha mãe repreende-me sempre que eu brinco com temas como a Morte ou Deus, dois temas que me são caros: o primeiro porque o enfrentarei, é ínequívoco, o segundo porque é um equívoco, o maior da humanidade. Um dia virá em que me encontrarei frente a frente com a morte, e sairei certamente derrotado. Com Deus, não tenho a mesma certeza, jamais estaremos frente a frente. Não se pode enfrentar algo que não existe.
Dizia eu que sofri algumas tristezas. Todas com algo em comum: pareciam sempre muito piores que a anterior. Decidi, porque ninguém decide de mim a não ser eu, pese embora ter levado anos a entender isso, que as tristezas iam acabar. Ora, não se consegue acabar com espécie nenhuma de coisa, sem se saber a sua origem. Tentei perceber o que motivava a tristeza que sentia, pensei nisso dias e noites a fio. Não sei quanto às tristezas dos outros, mas as minhas, havia apenas uma coisa que as motivava: a perda. A perda de alguém quue nos deixou, a perda de tempo, a perda de uma rotina boa, a perda de alguém que tivemos que deixar para trás, a perda de algo ou alguma coisa, mas sempre a perda. Nunca mais passei por tristeza nenhuma.
Eliminei a perda eliminando a posse. Escolho nada possuir, nem ninguém, e não deixar que ninguém me tenha realmente. Não perco nunca. Não me lembro da ultima vez que me senti triste. Também não significa que ande sempre eufórico de alegria. Mas sou feliz controladamente. Como com a maior parte dos meus sentimentos. Efectivamente, não me considero posse de ninguém, não no sentido rebelde e romântico do conceito, mas no sentido de não estar preso a estereótipos. Também entendo, com justiça, que ninguém me pertence. Os meus amigos não são meus, não me devem nada, não há exigências. Sabem que não têm que passar tempo comigo, nem têm que me ligar no aniversário ou no Natal para serem meus amigos. A minha mulher é livre. Pode ir embora quando quiser, não me deve nada. O prazer de a ter comigo enquanto ela quiser basta-me. A verdade é que vivo sem laços e isso agrada-me.
Em duas fases etárias diferentes da minha vida, os meus melhores amigos nessa altura morreram. Quais seriam as probabilidades? Um morreu a voltar da escola, em frente ao pai, que nunca mais voltou a ser o mesmo: caiu para trás com a mochila às costas e partiu o pescoço (explicado de forma grosseira). O outro morreu no sofá de sua casa quando lhe rebentou uma veia no cérebro (mais uma vez, tecnicamente pode ter outro nome, mas foi mais ou menos o que aconteceu). durante alguns anos tive receio de ter um novo melhor amigo. Parecia trazer comigo uma maldição.
Sempre lidei de uma forma discreta com os meus sentimentos. Desde que deixei de ser criança que se contam pelos dedos de uma mão as pessoas que me viram chorar ou simplesmente triste, e talvez tivéssemos ainda que cortar um ou dois dedos dessa mão. Não me orgulho da proeza, porque ela é mais egoísmo que outra coisa. Se não houver laços não há perdas. Uns poderão alegar que se não me entregar às emoções não vivo de verdade. Talvez. Mas eu vivo bem a minha parte. Li algures que passamos cerca de 20 anos da nossa vida a dormir. Nesse campo posso afirmar que vou aumentar, se a Morte não me atraiçoar, o meu tempo de vida em 10 anos. Durmo metade do tempo. Vivo mais.
Chegamos por fim ao meu lema de vida: não perder tempo com tristezas e pessoas que nos levam a elas e acima de tudo, tentar não dormir muito, é um desperdício. Simples. O resto vem naturalmente.

3 comentários:

Rita Mendes disse...

saber o que queremos da vida... saber o que não queremos e principalmente o modo de chegar aos objectivos é um incógnita....
conseguir esse lema e sobretudo acreditar nele com todas as forças não é fácil...mas ter reflectido nisso e acreditar que são em pequenas coisas que está o encanto da vida, apreciar os pequenos momentos e dar valor a quem nos tira sorrisos é louvável...

Goth Mortens disse...

Honestamente, Boo, não me parece louvável, antes comodista ou egoísta. Uma defesa, eu diria. Mas agradeço o comentário.

W. disse...

Grande texto! Fez-me pensar...