5 de outubro de 2009

Agora posso dizer...

Agora, 8 anos depois, posso confessar. Agora que os teus olhos perderam o brilho de outrora. Agora, enquanto jazes nessa cama, paralisada. Agora, posso dizer-te que os anos que passámos juntos não passaram de uma extraordinária farsa. Posso confessar, hoje, que nunca te amei. Nada do que aconteceu entre nós foi genuíno. Fui apenas um actor na tua vida, simulei todos os sentimentos, todos os sorrisos, todas as lágrimas. A felicidade nos meus olhos não foi mais do que espelho da tua. Quando não estavas, quando ninguém estava, despia a máscara do teu amor e podia ser eu, respirando de alívio durante breves minutos, sem nunca me esquecer que rapidamente teria que retomar a minha actuação no palco da tua vida perfeita. A verdade é que me foste sempre indiferente, completamente. Esta é a verdade do que sinto por ti: indiferença. O movimento dos teus olhos, quase mortiços, leva-me a acreditar que me consegues ouvir e que estás a perceber o que te digo. É uma pena que não consigas falar porque gostava de ouvir o que tens para dizer agora. Mas acho que posso imaginar. Ias começar por dizer que é impossível, como se ninguém conseguisse resistir a amar-te perdidamente. O teu pedantismo não te permitiria jamais antecipar esta minha confissão. Foi precisamente essa tua presunção que me levou nesta missão de te provar que não és nada. E a verdade é que és tão fraca que quase fizeste com que nem valesse a pena tudo isto. Deves estar a perguntar-te porque fiz isto mas não existe nenhum motivo. É o que eu faço, simulo sentimentos, não sei viver de outra maneira. Aconteceu contigo porque estavas lá, naquele dia, para eu te conquistar. Podia ter sido qualquer outra mulher, mas foste tu. Ainda bem que foste tu, porque facilitaste a minha tarefa. Não mereces o amor de ninguém. Não te amo. Neste momento tenho que mudar de vida. Acabou o que tinha contigo mas não posso deixar-te assim. O mundo não vai compreender e eu tenho que manter a minha farsa. Não posso acabar a relação com uma mulher moribunda e permanecer perfeito. Para manter a perfeição do meu amor as coisas têm que acontecer de outra maneira. Estas lágrimas que vês não são por ti. São parte da farsa porque vou ter que chamar uma enfermeira. Esta almofada que seguro nas mãos não é para te pôr mais confortável. E lembra-te... eu nunca te amei.

1 comentário:

Rita Mendes disse...

Olá!
não sei se será demasiado abuso começar por comentar um texto destes...
apenas sei, da minha misera experiência, que há pessoas que não nos merecem... e mesmo sabendo disso às vezes amamo-las.
se neste caso isto não acontece, óptimo! pior é amar alguem que nunca nos viu, que nos tentava moldar à sua imagem de perfeição, não vendo as lágrimas, as vontades e os sonhos!

podem não ter sido 8 anos, mas foram 5 e meio..- chegou bem, para ver que não é isto que eu quero... até posso nem merecer mais, mas ao menos vou à procura!

Embora se considere um "actor", é sempre melhor que isso aconteça na peça certa, penso eu...

Boo